Infecção em feridas: cuidados necessários
para uma boa cicatrização

É consenso que a presença de infecção na ferida, retarda e/ou impede a cicatrização. Isso ocorre quando as barreiras primárias da pele falham e os microrganismos (pela sua virulência ou por sua grande quantidade) passam a danificar o tecido local. A presença desses microrganismos dá início à resposta imune do indivíduo mas, a reação efetiva depende da força do sistema imunológico e da virulência dos microrganismos. Por exemplo, indivíduos que apresentam diabetes mellitus, desnutrição proteico-calórica, perfusão tecidual deficiente, doenças autoimunes ou imunossupressão ficam mais suscetíveis a contrair infecções.

Para uma compreensão mais profunda, temos que entender que todas feridas contêm microrganismos e que isso  não significa infecção. Contudo a carga microbiana da ferida pode mudar devido aos fatores locais, ambientais e sistêmicos. A infecção não ocorre de repente, mas sim, de maneira gradual e existe uma evolução que depende do aumento no número e virulência dos microrganismos, seguindo as seguintes etapas: contaminação; colonização; infecção local; infecção disseminada; infecção sistêmica.

Avaliar constantemente a ferida e compreender em qual fase ela se encontra, nos ajuda a identificar sinais e sintomas do aumento da carga microbiana e/ou da virulência. É como se a ferida “falasse”. Testes de microscopia modernos auxiliam muito nesse diagnóstico, mas, caso não tenha acesso, pode-se coletar uma cultura da ferida na qual será colhido uma amostra de tecido profundo, que identifica o organismo causador e sua potencial resistência aos antibióticos.

Contudo, observar o paciente de maneira holística é uma das ferramentas mais importantes para distinguir e identificar a etapa de uma ferida, pois ela emite sinais que permitem ao profissional de saúde compreender a gravidade de cada caso. Os sinais clínicos de infecção local são: aumento do exsudato ou piora no seu aspecto; presença de eritema e edema; aumento da dor  no local; atraso na cicatrização; presença de odor; tecido de granulação friável; aumento do tecido necrótico; aumento do tamanho da lesão; presença de crepitação, flutuação ou descolamento. Por sua vez, os sinais clínicos de infecção sistêmica são: febre; mal estar geral; presença de abscessos (pus); ruptura da ferida; leucocitose; celulite e aumento do eritema; confusão/delírio; anorexia (principalmente em idosos).

É importante ressaltar que a infecção da ferida também pode estar associada à presença de biofilme, que prejudica o tratamento da infecção. O biofilme é formado por complexas, estruturadas, coordenadas e funcionais  comunidades de bactérias e outros microrganismos, principalmente fungos que se fixam em uma superfície biótica (dentes, sistema intestinal, feridas) e/ou abióticas (rochas, plásticos, metais). Estas comunidades são envoltas de matrizes poliméricas que são produzidas por elas próprias, conferindo-lhes resistência aos mecanismos e células de defesa do indivíduo e aos agentes antissépticos e antimicrobianos.

Os objetivos no tratamento da infecção são reduzir e controlar a carga microbiana na ferida e ainda, prevenir uma reinfecção. E para isso devemos investir numa limpeza mais efetiva da ferida em cada troca de curativo, utilizando surfactantes e/ou antissépticos não citotóxicos. É importante também realizar o desbridamento mais agressivo em toda superfície da ferida e dos tecidos circundantes de todo tecido não viável ou friável, bem como  acompanhar o avanço da ferida, reavaliando-a constantemente.

Basicamente quando houver sinais de infecção local, deve-se usar um antisséptico e/ou antimicrobiano tópico; já quando houver sinais de infecção sistêmica, o antimicrobiano sistêmico deverá ser usado, porém, um médico ou especialista em feridas também deverá ser consultado.

Entretanto, é importante tomarmos cuidado com os antissépticos, pois alguns podem ser citotóxicos para as células essenciais no processo de cicatrização, como os leucócitos, queratinócitos e fibroblastos. Os antissépticos mais frequentemente usados são os compostos de iodo, prata, polihexanida e betaína (PHMB) e clorexidina que deverão ser utilizados em conjunto com desbridamento, principalmente quando houver suspeita de biofilme. Antibióticos tópicos devem ser evitados devido à resistência antimicrobiana e baixa absorção do princípio ativo, exceto quando o benefício supera os riscos. Já os antibióticos sistêmicos devem ser utilizados somente quando houver evidência clínica de infecção sistêmica.

O que é PHMB?

Na verdade trata-se de uma abreviação da substância chamada Polihexametileno biguanida, considerada um antisséptico com amplo espectro antimicrobiano, incluindo bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, fungos, vírus, esporos bacterianos e Biofilmes. O composto é similar aos peptídeos antimicrobianos (AMPs) que ocorrem naturalmente em nosso organismo, os quais são muito importantes na resposta imunológica inata e são produzidos pela maioria dos organismos vivos. O PHMB é amplamente utilizado na prevenção e tratamento de feridas devido às suas características de alto poder antimicrobiano, além de não causar resistência bacteriana e não ser citotóxico. Ele pode ser indicado para limpeza, descontaminação, prevenção e tratamento de infecções locais em feridas, incluindo a remoção de Biofilmes.

O uso do PHMB não é novo, possui uma história de mais de 60 anos que tem se demonstrado seguro e efetivo em aplicações diversas no tratamento de infecções oculares, sanitização de piscinas e recentemente no tratamento de lesões. Suas maiores vantagens estão na  baixa sensibilização da pele e sobretudo, nos estudos que revelam sobre sua biocompatibilidade ser superior à clorexidina, iodopovidona, triclosan, prata e sulfadiazina.

Portanto, além da avaliação assertiva da lesão pelo profissional da saúde e do constante acompanhamento do paciente, fazer uso do produto correto na higienização da ferida é um artifício importante para um tratamento de sucesso. Atualmente existem muitos produtos que já estão ultrapassados no conceito científico de eficácia no tratamento de feridas, sendo essencial que o profissional de saúde esteja atento e atualizado a esse detalhe, pois prevenindo e tratando infecções de maneira efetiva e eficiente estamos criando impactos significativos sobre a morbidade e mortalidade da população com feridas.